sábado, 4 de abril de 2009

ilimitado, parte 6

Meus amigos estavam parados, o carro que atravessava o sinal vermelho estava parado, a velhinha que atravessava a rua, o mendigo que pedia esmola em outro sinal e até os três pombos que passavam por nossas cabeças. Todos estavam parados, exceto eu e meus pensamentos.

Então o céu começou a escurecer e a terra tremer. Logo veio trovões e um vento forte começou a soprar. E do alto veio uma voz assustadora que disse:

-Está com medo humano?

Realmente não sabia o que dizer. Tudo parecia uma cena de filme e, inexplicavelmente, disse:

-Não.
-Bom. – Respondeu a voz.

Um raio caiu bem próximo de mim e dele surgiu um ser moreno com cabelos assanhados que disse:

-Tam dam! – Exclamou com empolgação enquanto fogos de artifício explodiam no céu. E então conclui, estava sonhando.
-Está vendo? O importante é ter uma entrava empolgante, o importante é a primeira impressão. O que adianta tantos poderes e não ter uma entrada triunfal? –Disse, rapidamente e com empolgação, o homem diante de mim.
-E quem seria você? – Perguntei. Se eu estava em um sonho, um dos mais estranhos que eu me lembrava, não havia motivos para ter medo.
-Um novo ilimitado nasce! – Continuou a falar, me ignorando completamente.
-Você está me escutando? – Perguntei com indignação.
-Então eu cheguei a tempo? Você não destruiu o mundo ou algo do tipo, não é? Uma vez, sem querer, um ilimitado destruiu um mundo e precisou de quase uma semana para colocar tudo no lugar. É complicado chegar em um tempo exato passando por diferentes dimensões sabia? – Fez uma pequena pausa olhando para meu rosto que demonstrava uma expressão vazia e depois continuou - Esqueci de me apresentar, pode me chamar de Chocolate. – Concluiu o falante homem.
-Chocolate? – Perguntei, realmente era o sonho mais estranho que eu me lembrava, não que eu me lembrasse de muitos sonhos.
-Sim! Chocolate a única substância que possui o mesmo delicioso sabor em todas as dimensões que já visitei. Eu serei o seu conselheiro jovem ilimitado.
-Conselheiro? Como assim ilimitado? – Perguntei um pouco confuso, ou melhor, mais confuso ainda.
-Cada pessoa é única verdadeiramente, mas sua existência se repete em outras dimensões. Nomes diferentes, empregos diferentes, pais diferentes, quem sabe até irmãos diferentes ou simplesmente um corte de cabelo diferente. As diferenças entre as existências podem ser tão grandes ou quase imperceptíveis. Mas em cada dimensão um ser não segue essa regra e se torna realmente único em todas elas. Esses seres foram em algum momento denominados de ilimitados por causa do que podem fazer e você meu jovem, é o mais novo ilimitado.
-Então eu posso parar o tempo? – Indaguei, ignorando quase que completamente o que ele acabara de falar.

Ele, imediatamente, com uma voz estridente que fez a terra tremer e eu, instintivamente, cobrir os ouvidos falou:

-Silêncio! A única regra que um ilimitado tem que seguir é nunca, jamais completar a frase “eu posso...”. Se alguém escutar, você nunca mais poderá fazer o que você disse. Você tem muita sorte que essa regra não se aplica quando um ilimitado escuta. Afinal, o que você pode fazer não é nem uma novidade para mim.
-Então eu sou algum tipo de mago? Tenho que dizer alguma palavra mágica? Que sonho maluco estou tendo.
-Mago? Em todos esses anos eu não presenciei uma real magia. Não somos magos, você precisa entender o que está fazendo, você nunca poderá fazer algo que não entende. – Falou com uma voz irritada e, depois de uma breve pausa, deu um sorriso, me segurou e voamos para muito alto.
- Não! – Foi a única palavra que consegui pronunciar antes de pararmos. Estávamos bem alto, passando um pouco do topo de um prédio que estava próximo.
-Será que você já sabe voar? – Disse seriamente antes de me soltar.

Dizem que quando está na eminência de morrer você ver sua vida inteira passando por seus olhos, mas eu não via nada além do chão se aproximando. Então tive um pensamento que me assustou bastante, não poderia ser um sonho. Eu já deveria ter acordado e se não é um sonho, então vou morrer.

-É, você não sabe voar ainda. – Disse Chocolate quando me segurava, e logo me soltava, há um metro do chão.
-Você está louco? Você quer me matar? – Exclamei sem muito fôlego.
-Não acha que está sonhando? Como poderia ti matar? E você não pode morrer tão facilmente.
-Não estou sonhando, já percebi isso. – Parei por um segundo para refletir sobre a sua resposta e continuei – Sou imortal? – Disse ainda sem saber se entendi realmente o que ele dissera.
-Claro que não. Você pode morrer como qualquer outra pessoa, mas, dependendo de sua criatividade, você pode sobreviver em ocasiões que normalmente uma pessoa morreria. Quem sabe se cortarem a sua cabeça... bem, nunca se sabe.

Chocolate ficou calado por um momento olhando para o meu rosto pensativo que tentava processar tudo que ele dizia e continuou:

-Tchau.

Imediatamente voltei do meu estado pensativo e, com uma voz exaltada, disse:

-Como assim? Você aparece e me diz que eu sou um “ilimitado”, me diz que eu tenho poderes, quase me mata e simplesmente vai embora? Não vai me dizer que “com um grande poder vem uma grande responsabilidade”? Que eu tenho uma importante missão para salvar a humanidade? Que eu tenho que lutar pela justiça? Que eu tenho que me tornar um super-herói? – Acho que eu exagerei um pouco.
-Não. Não sou seu pai e sim seu conselheiro. Você decide o que vai fazer com seus poderes. O meu conselho é que você faça o que achar melhor, mas realmente aconselho há não destruir o mundo e, principalmente, a dimensão. Porque se fizer isso você vai ter problemas.
-Por que eu destruiria o mundo?
-Ficarei de olho em você jovem ilimitado. Lembre-se da regra e decida-se. – Disse-me antes de desaparecer em um grande clarão que veio seguido de um barulho forte.
-Então? O que acha? – Disse Karla olhando para mim.

O tempo voltou a correr. O carro que passava no sinal vermelho quase acertou a velhinha que atravessava a rua, o mendigo conseguiu algumas moedas no outro sinal e os três pombos voavam para longe. Meus amigos agora estavam se movendo e se perguntavam o motivo de eu estar parado olhando para o nada.

-Não seria bom comer logo um sanduíche?

Continuamos andando em direção ao shopping. Estava com um pouco de fome, mas com muita vontade de experimentar e descobri o que eu poderia fazer com esses poderes. Chocolate me deixou livre, então acho que tenho que me divertir.

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